Dia dos namorados para os negrões e solidão para os neguinhos 5z2h6f
A solidão da população preta não acaba porque pessoas negras que seguem um padrão corporal estão sendo quistas 5c5t1
Dia 12 de junho é comemorado o Dia dos Namorados no Brasil. Sendo sincero, eu não tenho a menor ideia do porquê, mas achei um ótimo gancho para tratar de um assunto que, com frequência, me aflige. A gente está vendo uma certa aceitação de pessoas negras por conta da população brasileira, sobretudo os mais jovens. Parte desse processo ocorre devido à expansão da discussão sobre o racismo estrutural e outra parte porque as pessoas negras estão ocupando mais os meios de massa. O que vejo pouca gente discutir é que essa possibilidade de ser visto como um afeto não abrange todas as pessoas negras. 4z2x5o
Eu não estou falando apenas de desejo sexual, até porque isso já foi amplamente discutido, e sabemos que pessoas negras, no geral, sempre foram alvo de sexualização. Seja o homem com o mito do pênis grande, ou a mulher com a falsa associação à "quentura" de sua vagina, ambos são constantemente vistos como mais fogosos do que as demais pessoas. Graças a essas falácias, muitas pessoas negras foram estupradas durante o período da escravização. Então, não há glamour nisso. Já em um ado mais próximo, muitas pessoas negras, sobretudo homens, abraçaram essa sexualização e alimentaram essas falácias, frequentemente embebidos na masculinidade branca. Isso porque, comumente, era o único momento em que um homem negro se sobressaía em uma roda que contava com homens brancos.
Hoje já vemos pessoas negras, em uma quantidade um pouco maior, sendo almejadas para além do âmbito sexual. Mas quem são essas pessoas negras? Um fator que é indiscutível é o corpo que essas pessoas possuem, mas traços e tipo de cabelo também são relevantes nessas predileções por parceiros. Negros com nariz fino, cabelo cacheado, pele clara e corpo fitness, esses sim estão "em alta" no campo afetivo. Contudo, a grande parcela da população negra, formada por gente como a gente, segue sendo preterida e tendo suas escolhas sexuais e afetivas cerceadas por um muro enorme chamado padrão branco de beleza.
Outro ponto dessa análise que deve ser ressaltado é que as mulheres negras são a maioria nesse preterimento, e quanto mais distante uma mulher negra estiver desse ideal de beleza já mencionado, mais próxima da solidão e do celibato forçado ela estará. Se acrescentarmos a isso o etarismo e a questão de classe, essa discussão ganha tons ainda mais complexos. O mesmo vale para pessoas negras no universo LGBTQIA+.
Muitos podem estar pensando que essa mesma lógica vale para pessoas brancas. As ditas mais bonitas têm, de fato, mais escolhas. Contudo, a impressão que fica no cotidiano é que pessoas brancas, ainda que lidas como "feias", não precisam ter nada de especial para encontrar um parceiro. Além disso, muitas vezes, essa pessoa branca que muitos consideram feia está com uma pessoa negra linda, como se o fator racial funcionasse como um "equiparador". Com isso, não estou dizendo que é errado "palmitar" – nem nada nesse sentido –, mas é comum vermos essas pessoas brancas com determinado fenótipo mantendo relações, enquanto uma pessoa negra com o mesmo fenótipo não terá a mesma "sorte" no campo afetivo.
Que pessoas negras alcançaram alguma melhora no campo da conquista, não há dúvida, mas saber diferenciar o que é sexualização e perceber quais tipos de pessoas negras estão sendo cotadas como dignas de afetividades é essencial para que assuntos importantes não sejam apagados. Os negrões estão em alta, mas o neguinho segue sendo motivo de chacota. As negronas estão sendo cortejadas, mas as neguinhas continuam sendo sexualizadas. O amor deve ser para todas as pessoas, e é necessário refletir sobre para quem abrimos nosso coração e exigimos padrões de normalidade, e para quem apenas nos interessamos enquanto esperamos que essa pessoa mova o mundo por uma migalha de afeto.