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'Explosão' de casos de AVC segue tendência de crescimento anterior; não há relação com vacinação 5n314

POSTAGEM ENGANA AO ATRIBUIR A IMUNIZANTES CONTRA COVID AUMENTO DE INTERNAÇÕES POR ACIDENTE VASCULAR CEREBRAL; AUTOR DO POST NÃO ENVIOU POSICIONAMENTO 86v4

12 jun 2025 - 17h05
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O que estão compartilhando: que os casos de Acidente Vascular Cerebral (AVC) "explodiram" após as vacinas contra a covid. Foram cerca de 196 mil internações por AVC no Brasil em 2023, contra 163 mil em 2019, antes da pandemia. 6a6y6e

Foto: Estadão

O Estadão Verifica investigou e concluiu que: é enganoso. Não há qualquer evidência de que as vacinas contra covid causem AVCs. Os efeitos colaterais mais comuns dos imunizantes são leves, como dor no local da injeção, dor de cabeça e febre.

De acordo com especialistas ouvidos pelo Verifica, o aumento de casos em 2023 segue uma tendência já observada em anos anteriores — ela está relacionada ao fato de que as pessoas estão vivendo mais tempo e a fatores como hipertensão arterial, tabagismo, ingestão excessiva de álcool, obesidade e sedentarismo. Em 2020 e 2021, anos mais críticos da pandemia de covid, os números de internações por AVC tiveram um comportamento abaixo do esperado. O aumento abrupto observado nos anos seguintes foi, na verdade, um retorno à tendência de crescimento (entenda melhor abaixo).

O Verifica entrou em contato com o autor da postagem, mas não recebeu um posicionamento sobre a verificação.

Saiba mais: Viralizou no X (antigo Twitter) um gráfico com dados do Sistema Único de Saúde (SUS) sobre internações por AVC. O responsável pela postagem pegou a quantidade ano a ano de casos e gerou um gráfico de linha.

A imagem mostra um crescimento linear de 2015 até 2019. Os casos aram de aproximadamente 146 mil para cerca de 163 mil. Em 2020, quando teve início a pandemia, a linha cai. Em 2021 ela cresce, mas num patamar inferior ao de 2019. Em 2022, quando o número se aproxima dos 185 mil, a linha sobe abruptamente, até atingir um pico de 196 mil casos em 2023.

O autor usa o gráfico para alegar que houve uma "explosão" nos casos de AVC supostamente causada pela vacinação contra covid, que teve início no Brasil em janeiro de 2021. Publicada no dia 6 de junho, a postagem acumula cerca de 218 mil visulizações.

Casos de AVC seguem tendência de crescimento observada anteriormente

A "explosão" de internações por AVC após a pandemia segue, na realidade, uma tendência de crescimento observada em anos anteriores, de acordo com especialistas consultados pelo Verifica.

Para a análise dos dados de AVC, o Verifica contatou o doutor em Bioinformática e pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Minas Gerais Gabriel Fernandes. Ele também é pesquisador do CTVacinas, um centro de pesquisas em Biotecnologia.

Fernandes refez os os que o autor da postagem no X indica. O pesquisador consultou a quantidade de atendimentos associados a internações por AVC no DataSUS, mesma fonte usada no post enganoso.

O pesquisador analisou dados de 2008 (ano mais antigo disponível) a 2019 (ano que precedeu a pandemia). Ele usou os números desse período e elaborou uma equação que calculasse o incremento anual das internações por AVC, para predizer qual seria a quantidade de notificações esperadas de 2020 a 2024.

O que ele fez foi observar como era o comportamento dos números antes da pandemia, para projetar como seria o crescimento nos anos seguintes, explicou ele. Abaixo está o gráfico gerado pelo pesquisador:

Como mostra o gráfico, em 2020 e 2021 os casos reportados no DataSUS diminuíram muito, ficando abaixo do esperado. "Esses números não nos permitem entender o que causou esse comportamento. Isso pode ser devido a diversos fatores e não há uma explicação simples" alertou ele.

Algumas das hipóteses levantadas por ele são: a priorização das notificações para casos de covid e a redução nas internações. As pessoas podem ter optado evitar os hospitais no auge da pandemia.

De acordo com Fernandes, o salto de casos de 2021 para 2022 é abrupto não por causa de uma "explosão" de casos, mas sim porque houve uma "correção" para o retorno à tendência normal de crescimento.

O pesquisador faz uma analogia com o Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil para mostrar como um crescimento aparentemente repentino pode enganar. Suponha, sugere ele, que o PIB do país cresça 1% ao ano, chegando a R$ 100 trilhões, e, de repente, cai 5% em um ano de catástrofe, indo para R$95 trilhões.

"Se no ano seguinte ele subir 6,31%, e atingir R$ 101 trilhões, ele não 'explodiu', ele só corrigiu a queda anterior e voltou à tendência original", exemplificou.

Quantidade de AVCs crescem há décadas

A neurologista Adriana Conforto, integrante da diretoria da Sociedade Brasileira de Acidente Vascular Cerebral (SBAVC), explica que há mais de vinte anos, muito antes da pandemia de covid e da vacinação contra a covid, o número de AVCs tem crescido no mundo todo. Os motivos para isso são o aumento da longevidade da população e a negligência de fatores que podem causar AVC.

"As pessoas estão vivendo por mais tempo, e a idade mais avançada é um fator de risco para AVC", informou Conforto.

Das cerca de 2,5 milhões de internações por AVC que ocorreram no Brasil de janeiro de 2008 a abril de 2025, 1,8 milhão foram em pessoas com 60 anos ou mais. Isso corresponde a 72% dos casos.

A neurologista da SBAVC destaca ainda que condições que estão fortemente associadas ao risco de AVC, como a hipertensão arterial, o tabagismo, a ingestão excessiva de álcool, a obesidade e o sedentarismo, não estão sendo evitadas ou tratadas adequadamente.

"É estimado que 90% dos casos de AVC poderiam ser evitados pelo controle desses fatores de risco", informou.

A neurologista aponta que apenas observar o crescimento no número de internações por AVC não permite esclarecer o que as causou. Ela diz que, para provar uma suposta relação com vacinas contra covid, seria necessário verificar aspectos que foram totalmente ignorados pelo autor da postagem enganosa.

Conforto lista os seguintes fatores:

Quantas pessoas internadas por AVC haviam sido vacinadas, e quantas não foram;Qual a idade das pessoas internadas por AVC e quantas tinham hipertensão, fumavam ou eram obesas. Esses fatores poderiam explicar o aumento no número de internações;Se houve melhoras nos sistemas de saúde, que aperfeiçoaram o diagnóstico de AVC e viabilizaram internações por AVC no período; A gravidade dos casos de AVC.

A neurologista diz que criar relações de causa e efeito superficiais, como fez o autor da postagem do X, pode ser perigoso. Como exemplo, ela cita o câncer de pulmão. É sabido que pessoas que fumam têm maior risco de terem câncer de pulmão e AVC, mas pessoas que fumam tendem a tomar mais café.

"Se uma pessoa olha apenas o número de pessoas que tomam mais café e o número de internações por câncer de pulmão, sem olhar quantas dessas pessoas fumavam, pode pensar que tomar café causa câncer de pulmão e AVC", exemplificou. "Quando na verdade o café não tem nada a ver com o risco de câncer".

Não há evidências que vacinas causam AVC

O Ministério da Saúde faz monitoramento de qualquer ocorrência médica indesejada após a vacinação, que pode ou não ter sido causada pelo imunizante. Essas ocorrências recebem o nome técnico de Evento Supostamente Atribuível à Vacinação ou Imunização (Esavi).

Qualquer profissional de saúde, previamente cadastrado na plataforma gov.br pode notificar Esavis e erros de imunização diretamente no sistema e-SUS Notifica. A base de dados gerada, segundo explica o site do DataSUS, conta com informações individualizadas sobre os Esavis notificados. Somente após uma investigação é possível saber se houve ou não algum nexo causal entre a vacinação e o evento.

De acordo com Ministério da Saúde, não há evidências científicas de que vacinas contra a covid causem AVC. "Eventos adversos são extremamente raros e, quando ocorrem, geralmente têm outras causas", informou a pasta em nota enviada ao Verifica.

A pesquisadora em Saúde Pública da Fiocruz e do CT Vacinas Rafaella Fortini coordenou estudos sobre vacinas contra a covid durante a pandemia e teve contato com Esavis. Em pesquisa publicada pela revista científica Frontiers em junho de 2022, que avaliou 1.587 indivíduos que foram vacinados com duas doses da CoronaVac e reforço da Pfizer-BioNTech, alguns apresentaram eventos adversos. Fortini informou que, na sua maioria, os episódios foram leves, como dor de cabeça, dor no local da injeção, diarreia e náusea.

"Não houve eventos graves causados pelas vacinas", informou ela.

Na avaliação de Fortini, a postagem feita no X é uma peça de desinformação perigosa, que ignora os benefícios comprovados das vacinas e os riscos de sequelas crônicas reais geradas pela covid.

"A ciência e o monitoramento de dados e evidências de mundo real de todo o mundo são claros: vacinar-se é a melhor forma de reduzir a chance de ter doença aguda grave e também sequelas graves após a infecção, incluindo o próprio AVC", afirmou.

O Verifica entrou em contato com o Ministério da Saúde pra que comentassem o gráfico gerado pelo usuário do X, mas não teve retorno até a publicação da matéria.

Recentemente, o Verifica mostrou que o AVC sofrido pelo divulgador científico Pirulla não foi causado por vacinas.

Estadão
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