Reação de Trump a protestos acirra clima de guerra institucional w5q6g
Presidente dos EUA ignora ordens de juízes federais, reinterpreta leis, atropela Congresso e envia militares a manifestações. Ao testar limites do poder, republicano põe em risco pilares democráticos do país.A tensão em Los Angeles, onde milhares de pessoas protestam há dias contra as medidas do Departamento de Imigração dos EUA, continua alta. Um toque de recolher noturno imposto pela prefeitura acalmou um pouco os ânimos na madrugada de quarta-feira (11/06). Mas não há sinais de que vá continuar assim. 2q5t5m
Junto à Guarda Nacional, enviada no sábado pelo presidente Donald Trump, seguem-se agora 700 soldados da Marinha americana - conhecida por ser uma unidade de elite das Forças Armadas e uma tropa de intervenção rápida.
De acordo com uma porta-voz das Forças Armadas dos EUA, os soldados devem ajudar a proteger edifícios e funcionários do governo, incluindo os da agência de imigração ICE (Immigration and Customs Enforcement).
Desde sexta-feira, a população do sul da Califórnia está indo às ruas para protestar contra as batidas policiais realizadas por agentes da ICE em locais públicos, à procura de pessoas sem documentos válidos para deportá-las.
Em alguns casos, imigrantes em situação irregular têm sido presos nas ruas por agentes encapuzados da ICE. Isso é parte da rígida política de imigração do governo Trump que agora será defendida também com o apoio das Forças Armadas.
Direitos para o presidente em casos especiais
Normalmente, o presidente dos EUA não pode enviar a Guarda Nacional ou a Marinha para nenhum Estado. A ordem para a intervenção deve vir da liderança do Estado em questão. Na Califórnia, o governador democrata Gavin Newsom rejeitou expressamente a intervenção das tropas federais e ingressou com uma ação judicial.
Em casos especiais, no entanto, o presidente americano pode convocar unidades militares para um estado onde esteja ocorrendo uma revolta contra uma ou mais autoridades nacionais, mesmo sem notificar o governador. Isso está previsto na chamada "Lei de Insurreição" (Insurrection Act), de 1807.
Mas a intervenção militar na Califórnia ordenada pelo presidente Trump é incomum, já que a autonomia dos 50 estados é considerada sagrada. O governador Newsom fala em abuso de poder e alerta que a democracia americana, nas mãos de Trump, está em perigo.
"A Califórnia pode ser a primeira, mas obviamente não termina por aí. Outros estados serão os próximos. A democracia será a próxima", disse Newsom em um discurso na televisão na noite de terça-feira.
Trump ignora Judiciário
Fato é que, nesses primeiros cinco meses do seu segundo mandato, Trump já entrou várias vezes em conflito com as instituições democráticas dos EUA. Um exemplo são as deportações que impôs, contrariando ordens judiciais: desde março, mais de 250 supostos terroristas que não são cidadãos americanos foram deportados para El Salvador. Os voos que levaram os migrantes para uma prisão decolaram apesar da suspensão provisória expedida por um juiz federal.
Para colocar essas deportações em prática, Trump invocou, tal como na intervenção militar em Los Angeles, uma legislação com séculos de existência: a Lei dos Inimigos Estrangeiros (Alien Enemies Act), de 1798, que permite ao presidente deportar estrangeiros de uma "nação inimiga" sem esperar pelos procedimentos habituais dos tribunais de imigração. O governo Trump alega que os deportados são terroristas da gangue venezuelana "Tren de Aragua", o que torna a ação legalmente válida.
O Judiciário é um dos pilares do poder nos EUA, juntamente com o Executivo (Presidência) e o Legislativo (Congresso). A separação de poderes entre esses três forma a base da democracia americana - algo que o comportamento de Trump pode enfraquecer. Na Suprema Corte, a mais alta corte dos EUA, seis dos nove juízes são abertamente conservadores, três deles nomeados pelo próprio Trump - um cenário favorável aos interesses do presidente.
Trump leva "poder ao limite"
E o Congresso, o braço legislativo do poder? Trump ou por cima dele logo no início de seu segundo mandato.
Embora todos os presidentes recorram a decretos presidenciais, que não precisam ar pela Câmara dos Deputados e pelo Senado, no caso de Trump isso aconteceu muitas vezes: 161 até 10 de junho, somente neste segundo mandato, mais do que qualquer outro presidente desde a Segunda Guerra Mundial. E são decretos que têm amplas consequências, por exemplo, para os direitos da comunidade LGBTQ+ ou para o comércio mundial.
"Trump definitivamente entrará para a história como aquele que levou o poder do Executivo ao limite", diz à DW Patrick Malone, professor de istração pública e política na American University. Ele cita dúvidas, por exemplo, sobre a legalidade do fechamento de agências federais e a demissão em massa de funcionários públicos, em nome da eficiência.
"A questão da legalidade das ações deste presidente ocupará os tribunais por anos", afirma o cientista político.
E como ficam as instituições democráticas dos EUA? Segundo Malone, elas estão sob forte pressão. Um dos problemas é que as leis são aplicadas hoje em um país completamente diferente daquele que as criou, há mais de 200 anos.
Mas o especialista também se mostra otimista: "Em geral, é muito difícil derrubar instituições. Espero que, no final, os princípios da democracia prevaleçam."